A limpeza clonal é realizada em laboratório com vistas à eliminação de vírus e demais micro-organismos nocivos à planta do alho
Tabulação dos dados levantados pela Secretaria de Agricultura do município baiano de Cristópolis, e divulgados em junho último, não deixam dúvidas: a tecnologia do alho-semente livre de vírus (ALV) está inteiramente consolidada na região, e num processo contínuo de evolução. Conforme o levantamento, dos 60 pequenos produtores, 58% cultivam o alho livre de vírus de primeira geração, também chamado G1, um percentual que reflete a confiança na tecnologia, baseada nos resultados que vêm sendo alcançados.
Desenvolvida pela Embrapa Hortaliças (Brasília, DF), a tecnologia é ancorada em um processo de limpeza clonal realizada em laboratório com vistas à eliminação de vírus e demais micro-organismos nocivos à planta do alho. O alho-semente produzido nesse sistema foi apresentado em 2002 aos produtores de Cristópolis, município dependente economicamente em gênero, número e grau da cultura do alho, a qual vinha, ano a ano, registrando perdas pela baixa qualidade do material, infectado por viroses.
Dez anos depois, outra realidade. Com a adoção do ALV, a produtividade do município registrou em 2012 um aumento substancial, passando de 4,5 toneladas por hectare para 16 toneladas, simplesmente um aumento de 250% em dez anos de uso da tecnologia. “Cristópolis foi o município pioneiro, onde implantamos as unidades de multiplicação e, desde então, o processo foi evoluindo, inicialmente com telados individuais de 18 metros quadrados, para cada produtor produzir seu alho-semente comercial – atualmente, trabalha-se com telados coletivos de 100 a 200 m2 mantidos por associações de agricultores e pelo sindicato rural”, conta o pesquisador Francisco Vilela, que coordena o programa de alho livre de vírus da Embrapa Hortaliças.
No caso especial dos telados, o pesquisador chama a atenção para a sua importância na obtenção de um material sadio para a multiplicação do alho-semente. “O telado é a melhor ferramenta para manter o alho livre de vírus e garantir a qualidade, o que não ocorre com a semente plantada no campo”, afirma Vilela, que aponta, ainda dentro dessa questão, uma prática que não deve ser relativizada pelo produtor – a substituição periódica da semente.
“Há casos em que o produtor compra a semente produzida em telado e planta em sua área de cultivo no campo aberto, só que essa semente não deve ser multiplicada mais que três anos, porque após esse período a semente estará reinfectada, perdendo vigor e produtividade”, adverte.
Difícil começo
Mudanças nem sempre são de fácil assimilação e, no caso da tecnologia do alho-semente livre de vírus, essa foi a tônica do enredo. Em comum acordo com os agricultores, foram instalados cinco telados pequenos em cinco áreas produtoras de Cristópolis, fornecidos pela Embrapa, em regime de comodato. Dos cinco agricultores, só um acreditou na tecnologia. A desconfiança dos agricultores deveu-se ao tamanho dos bulbos colhidos no telado, os quais em função do adensamento de plantio não atenderam às expectativas – eram cabeças muitas vezes menores do que as produzidas na região.
À vista desses resultados, à exceção do produtor José Borges de Brito, conhecido como Valdez, quatro dos telados foram abandonados. “Nos dois primeiros anos, mesmo não vendo progressos, ele continuou acreditando, um voto de confiança que foi recompensado no terceiro ano, que representou um divisor de águas na sua vida”, sublinha o pesquisador, que credita a essa aposta o sucesso da tecnologia na região. “Se ele não tivesse insistido, provavelmente o nosso trabalho teria sido perdido”, avalia.
De acordo com Vilela, quando a produtividade do agricultor dobrou, de seis para 12 toneladas, começou o movimento dos demais para recuperar o tempo perdido. “Para apresentar a tecnologia, todos os recursos foram utilizados: palestras e dias de campo, mas a experiência exitosa de Valdez foi a ferramenta mais eficaz de convencimento”.
Segundo o pesquisador, mesmo com tecnologia já consolidada na região, o trabalho prossegue. “Não existe marcha à ré nesse caso e, daqui para frente, as atividades passam a girar em torno da melhoria do padrão tecnológico desses agricultores para que possam aproveitar ainda mais o potencial dessa semente e, assim, atingirem um volume de produção ainda maior”.